É
o fim!
Chegamos
ao fim!
Estamos
no fim!
Passamos
do fim!
Nós
olhamos para o fim como um passado recente, mas tão recente, que eles ainda se
negam a aceitá-lo.
Eles
estão de luto!
Chorando
as misérias, se agarrando aos escombros, gritando a plenos pulmões seus últimos
insultos, buscando mais um segundo de respiro, só mais um segundo de uma vida
em abundância que um dia foi prometido a eles.
Para
eles a abundância acabou!
Henrique Gonzaga
No dia 17 de setembro de 2021, tivemos a abertura
do 3° Seminário Periferias Insurgentes- Terra- Lingua- Cidade- Negrura. Um espaço
pensado para ser de construção de pensamento sobre as forças poéticas e
políticas da periferia. O Seminário Periferias Insurgente chega a sua terceira
edição em meio a uma pandemia que tem nos feito pensar sobre o fim.
E o “fim” foi o mote para pensar a mesa 2 do
seminário, intitulada como Encruzas da
Língua: Corporeidades do fim do mundo, onde convidamos Nívea Sabino,
mineira, poeta-slammer, ativista e educadora social e Romaria Holanda, artista, educadora popular, militante
cultural, licenciada em Teatro pelo Instituto Federal do Ceará - IFCE.
Nívea Sabino, chegou com a palavra e com ela veio
a força do discurso poético da favela, onde a rima com sua métrica imperfeita
aos olhos do clássico nos trouxe um pouco da sua trajetória dentro dos espaços
de construção da poesia, dos saraus, das ocupações da cidade e como esses
espaços têm sido importantes para a construção da imagem de si e de tantas
outras pessoas pretas, que por séculos foram construídas por homens, brancos,
héteros que com suas palavras, milimetricamente pensadas para diminuir e
escravizar nossos corpos, nos lançou para fora das possibilidades de
partilhamento de conhecimento, mas que cada vez mais tem sido confrontado pela
poética das narrativas pretas.
Romaria Holanda, com a beleza e potência de sua
experiência como uma pessoa travesti, negra, artista, assentada na Comunidade
de Caetanos de Cima, nos convida a pensar sobre a violência do silêncio que nos
é lançado como condição de existência, e como é importante abrir rachaduras no
que nos é posto para a criação de espaços de construção de falas, de rompimento
desse silêncio. A partir da sua experiência na Comunidade de Caetanos de Cima,
Romaria reflete como a compreensão da coletividade tem sido potente na
ampliação dessas fissuras.
Nívea e Romaria trouxeram para o Seminário
Periferias Insurgentes , o poder da palavra e dessas corpas que por muito tempo
foram silenciadas, mas que agora passam a berrar em nome de tantas que vieram
antes nós. Os nomes, as vidas e as obras que foram queimadas em nome da fé e do
poder, hoje habitam cada poesia falada na favela, cada canto entoado nas rodas
à beira do mar, em cada escrita pichada nos muros.
Nossas memórias foram registradas nas falas das
que vieram antes de nós, nas conversas e histórias contadas. A oralidade foi o
nosso livro a céu aberto, a mistura do real e ficcional da fala tem abastecido
as nossas narrativas e ampliado o alcance da nossa história, como Nívea fala:
“estamos batendo laje no imaginário das pessoas. E pra bater laje precisa de
muita gente”.
De palavra em palavra, de memória em memória, de
encruzilhada em encruzilhada as narrativas têm brotado sem pedir licença às
normas e elas não vão parar.
O momento da mesa Encruzas da Língua: Corporeidades do fim do mundo, foi um encontro
mediado pela palavra, composto pelo afeto e eternizado como experiência. Já não
podem mais apagar a nossa história, nós estamos registrando ela da nossa forma,
com as nossas palavras, com as nossas escritas, com as nossas performances, com
as nossas corpas e não há nada que possa ser feito contra isso.
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