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E DEPOIS DO FIM? // Por Henrique Gonzaga

Posted by Nóis de Teatro On 16:47 No comments

 


 

É o fim!

Chegamos ao fim!

Estamos no fim!

Passamos do fim!

Nós olhamos para o fim como um passado recente, mas tão recente, que eles ainda se negam a aceitá-lo.

Eles estão de luto!

Chorando as misérias, se agarrando aos escombros, gritando a plenos pulmões seus últimos insultos, buscando mais um segundo de respiro, só mais um segundo de uma vida em abundância que um dia foi prometido a eles.

Para eles a abundância acabou!

Henrique Gonzaga

 

No dia 17 de setembro de 2021, tivemos a abertura do 3° Seminário Periferias Insurgentes- Terra- Lingua- Cidade- Negrura. Um espaço pensado para ser de construção de pensamento sobre as forças poéticas e políticas da periferia. O Seminário Periferias Insurgente chega a sua terceira edição em meio a uma pandemia que tem nos feito pensar sobre o fim.

 

E o “fim” foi o mote para pensar a mesa 2 do seminário, intitulada como Encruzas da Língua: Corporeidades do fim do mundo, onde convidamos Nívea Sabino, mineira, poeta-slammer, ativista e educadora social e Romaria Holanda, artista, educadora popular, militante cultural, licenciada em Teatro pelo Instituto Federal do Ceará - IFCE.

 

Nívea Sabino, chegou com a palavra e com ela veio a força do discurso poético da favela, onde a rima com sua métrica imperfeita aos olhos do clássico nos trouxe um pouco da sua trajetória dentro dos espaços de construção da poesia, dos saraus, das ocupações da cidade e como esses espaços têm sido importantes para a construção da imagem de si e de tantas outras pessoas pretas, que por séculos foram construídas por homens, brancos, héteros que com suas palavras, milimetricamente pensadas para diminuir e escravizar nossos corpos, nos lançou para fora das possibilidades de partilhamento de conhecimento, mas que cada vez mais tem sido confrontado pela poética das narrativas pretas.

 

Romaria Holanda, com a beleza e potência de sua experiência como uma pessoa travesti, negra, artista, assentada na Comunidade de Caetanos de Cima, nos convida a pensar sobre a violência do silêncio que nos é lançado como condição de existência, e como é importante abrir rachaduras no que nos é posto para a criação de espaços de construção de falas, de rompimento desse silêncio. A partir da sua experiência na Comunidade de Caetanos de Cima, Romaria reflete como a compreensão da coletividade tem sido potente na ampliação dessas fissuras.

 

Nívea e Romaria trouxeram para o Seminário Periferias Insurgentes , o poder da palavra e dessas corpas que por muito tempo foram silenciadas, mas que agora passam a berrar em nome de tantas que vieram antes nós. Os nomes, as vidas e as obras que foram queimadas em nome da fé e do poder, hoje habitam cada poesia falada na favela, cada canto entoado nas rodas à beira do mar, em cada escrita pichada nos muros.

 

Nossas memórias foram registradas nas falas das que vieram antes de nós, nas conversas e histórias contadas. A oralidade foi o nosso livro a céu aberto, a mistura do real e ficcional da fala tem abastecido as nossas narrativas e ampliado o alcance da nossa história, como Nívea fala: “estamos batendo laje no imaginário das pessoas. E pra bater laje precisa de muita gente”.

 

De palavra em palavra, de memória em memória, de encruzilhada em encruzilhada as narrativas têm brotado sem pedir licença às normas e elas não vão parar.

 

O momento da mesa Encruzas da Língua: Corporeidades do fim do mundo, foi um encontro mediado pela palavra, composto pelo afeto e eternizado como experiência. Já não podem mais apagar a nossa história, nós estamos registrando ela da nossa forma, com as nossas palavras, com as nossas escritas, com as nossas performances, com as nossas corpas e não há nada que possa ser feito contra isso.




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